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Parte VIII - Crisântemos (o que foi, o que pode ter sido)

(Extraído de TANTÁLIA - O ator como testemunha no processo criativo, monografia apresentada em 2014, orientada por Maria Thais Lima Santos)

A temática do projeto habita a Crença, mas intuo que o tema maior seja a Sensibilidade, que a contém como forma de manifestação. Pretendíamos fazer da cena o lugar de laboratório da sensibilização, e esta viria paralelamente à construção temática da peça - que tinha a sensibilização como um dos temas. Cada ator, cada vez que se punha em risco ou em uma situação de exposição ou vulnerabilidade, reconheceu seus mecanismos se sensibilização. A peça transcorre, fabularmente, como a busca de quatro pessoas por sensibilidade e de fato, há quatro atores tentando resgatar alguns de seus momentos de maior suscetibilidade ao longo do processo, além de tentar fazê-lo com o domínio do ator que sabe o seu ofício. Tivemos como maior suporte para Tantália o conto homônimo de Macedônio Fernandez, e nossa intenção era que ele fosse reconhecível nessas tentativas de dar vida às criações destes atores. Em cena, o que deveria transbordar eram a memória presentificada das operações exploradas no percurso, cujas funções primárias eram a sensibilidade e a realidade. Relembrar o processo seria então a nossa tentativa desesperada de recuperar, ou melhor, de instaurar uma sensibilidade outra, análoga a do narrador do conto. A crença surge como uma consequência, creio, da exigência dos atores de transmitir veracidade em cada ato. É necessário crer na cena quando não há mais nada em que se apoiar, e então, por meio da crença ela se materializa. Embora um dos principais intuitos fosse o de gerar desconfiança e dúvida no espectador, nós éramos os únicos ali que não poderíamos ser gerados por ela. Deveríamos habitar o espaço da ficção, para não minguar como um fermento diante de alguém que questiona seus métodos.

Para não me perder mais do que o costume em elucubrações a respeito dos sentidos que eu dou à peça – pois ao final da escrita sinto o cansaço de quem falou por tempo demais sobre um filme mudo – devo dizer que o meu projeto de atuação habita o meu imaginário, o que fiz como o atriz e o que organizamos como estrutura, mas principalmente, o que chega ao público. E da recepção eu não posso cogitar dar conta.

Por isso relembro a peça por uma sinopse:

Quatro pessoas se encontram ao acaso e descobrem algo em comum: sentem-se esgotadas. Juntas, fundam um grupo para retomar a sensibilidade perdida. Há um limite de tempo para essa retomada; ela deverá ocorrer até o dia do desastre. A primeira ação do grupo é cuidar de uma planta. Cada um recebe um vaso, sementes e terra. Em seguida, cada um cria outros meios para resgatar a sensibilidade. O público é testemunha desse processo e acompanha o último dia do encontro. Nesse dia, o grupo ocupa um espaço montado para uma gravação. Há um cromaqui, alguns objetos e uma câmera. O dia do desastre, o último encontro, será gravado.

Qualquer semelhança não é coincidência. Ganhamos sementes, terra e um vaso. Cuidamos desde a germinação à floração de uma flor cujo nome desconhecemos, mas que respira independente de nossa vontade. Cada etapa de seu crescimento representou uma etapa de sensibilização, e por fim comemorávamos cada novo galho e combatíamos pragas com a mesma força com que combatíamos ranços na atuação. As plantas eram símbolos do processo, do que correu paralelamente, na vida, das figuras, da atriz. E ao mesmo tempo não importavam, estavam fadadas como humanos e processos ao fim certo, à morte. Não chegamos a ver a floração de todas elas, e por isso permaneceram anônimas até o final da temporada. Ao final de cada apresentação, uma dessas plantas morria pelas nossas mãos, e chegávamos ao fim.

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